:: o impossível aconteceu

junho 11, 2000



há histórias que foram escritas para não acontecer. como há vidas que foram desenhadas para não se cruzarem. daquelas que sabemos que não vão nunca ser possíveis: duas pessoas que nasceram em cidades diferentes, mundos diferentes, que vieram em países diferentes, que conheceram pessoas diferentes toda uma vida.. trouxeram duas culturas diferentes nas raízes, nos valores, nas tradições. famílias de percurso tão difuso que nunca se cruzaram em nenhum ponto na vida. nem um amigo comum, nem uma cidade, nem uma rua..

mas o impossível aconteceu. por uma mão cheia de acasos, pequenas coincidências, quase um acumular de pequenos milagres, houve um ponto de contacto na vida: uma música. e atrás disso um concerto, e um amigo de uma amiga, o primeiro olhar e o primeiro beijo - ainda no rosto. e o primeiro gin, o primeiro riso despregado, e um filho, logo ali, naquele dia, a mostrar as prioridades. e a frase: "esta mulher vai marcar a minha vida. sei-o". depois foi um novelo que começou num fio e cresceu sem parar. um desafio, um copo antecipado, uma noite a dois no meio de todos, e um abraço - com outra música. e um amanhecer inesquecível, como se a luz ali fosse mais que apenas um sol. .e começou a loucura, 1 milhão de letras em 3 meses, uma presença sôfrega sempre a querer mais, a descobrir mais, a viver mais.

e o mais estranho de tudo: duas almas que afinal eram só uma, mesmo nascendo em mundos impossíveis de serem iguais. mas que afinal.. sempre foram assustadoramente iguais: nos princípios de vida, nos gostos da música, nas bases de culturas, que sendo diferentes, tem tanto de comum: o respeito, o carinho, a vontade de sorrir, o colo do pai, a força da mãe. a estética importante, mas os valores primeiro. o prazer sempre presente, mas o carinho e o cuidado acima de tudo. loucura como na infância e na juventude se ouviu, viu e viveu tanta coisa igual. em dois países diferentes, em duas culturas diferentes. mas impossivelmente iguais. quase levou à loucura, a descoberta de tanta coisa igual - sempre a mesma cara de espanto, mas de alegria: o mesmo disco, a mesma roupa, o mesmo gosto, o mesmo sabor da vida. da família. dos dias simples..

mas superados os primeiros impossíveis, os que estavam para trás, apareceram os outros: os que estavam para a frente. uma partida necessária, um medo de perder que se fez de mentiras para evitar a realidade dura. opções erradas, medos do querer, e aquela prioridade: um filho que é tudo. e será sempre tudo. bipolaridade, lamechices, fraquezas, até falta de pulso às vezes. a tolerância que ás vezes foi demais e não prendeu. as promessas que às vezes foram demais, não do que se queria, mas do que se conseguia. e doeu. aos dois. e quebrou, e separou. mas, o impossível aconteceu. a força do que se quer é sempre maior. e lutou-se, aguentou-se, deu-se esperança, deu-se força, deu-se colo. a protecção de mesmo longe, saber estar sempre algo perto. um vídeo, um presente, uma palavra. um gesto que fosse, todos os dias, que sempre fez acreditar, querer. que fez, mais que sonhar - ter a certeza férrea.

mas voltando aos impossíveis, há coisas que não se explicam, que não deviam acontecer. mas que são tão reais que tiram o fôlego: dois corpos que por mais longe que estejam, estão sempre mais perto quando se reencontram. o toque que é sempre mais intenso, o olhar que é sempre mais conhecido. dos dois e de todos os que rodeiam. o filho que se entrega ao "segundo pai", a família que sem saber explicar porquê se envolve de raiz no primeiro encontro, os amigos que passam a ser manos em poucos dias. uma proximidade que vem de todos os lados, que disparam em cada sinal. e mais importante: um crescer junto. em tão pouco tempo, pequenos traços que se soltaram. pequenos detalhes que se reforçaram. a loucura, a safadice, as lágrimas que escorreram, o sono que sossegou, o amor que se entregou. mas cresceu-se, poliu-se, ficou-se mais bonito. são tão mais bonitos juntos, do que alguma vez seriam separados..

e pergunta-se: se soubesses o que ia acontecer há dois anos atrás, fazia-lo?
e como no filme digo: fazia sim. vezes sem conta até dar certo. porque preferi ter tudo o que tive até agora, do que a eternidade sem o conhecer. é essa certeza, essa força que diz que o que vem aí, o que está a acontecer agora, por estes dias, não é ainda uma meta, mas já é mais um impossível que aconteceu: a vida vai mudar, a oportunidade está aí, o nosso caminho junto, vai ser agora igual. na mesma cidade, no mesmo ritmo, um crescer sempre maior - aquele novelo que começou num fio, numa simples música.. e haverá certamente mais uma data de impossíveis pela frente. eles que se cuidem baby, porque vão ter de dobrar, vão ter de nos deixar passar, este novelo que virou roupa, que virou manta: o nosso cobertor que protege, que aconchega, que guarda a nossa vida, a família, os nossos. o que nos torna tão fortes? tão simples: eu e tu. um fio que afinal era o mesmo, desde o dia em que nascemos.. de alma impossívelmente igual: a mesma.

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