:: parte de mim

setembro 17, 2015


há coisas na vida que se gostam.
que nos sabem bem ao sabor, aos sentidos. coisas que nos fazem felizes por momentos, ou por dias. uma música, um jantar realmente bem feito, uma paisagem ao por do sol, umas férias - curtas ou longas, aquele casaco no primeiro frio do outono, ou aquela camisa de linho nas primeiras noites quentes de maio. ou o toque dos pés na calçada quente nessa mesma noite. momentos que se vivem por minutos ou horas, mas que nos dão sensações de prazer, que ficam na memória curta e que nos fazem dar sentido aos dias: adormecemos com aquela imagem de um dia bem passado, bem vivido. e um sorriso feliz.

depois há coisas na vida nos preenchem.
o abraço da família, o riso dos amigos, um olhar de ternura quando se tem um gesto bom, uma mão que toca, quando se diz adeus. mais que momentos que se vivem, são sensações que despertamos nos que rodeiam. interacção bonita esta de dar e receber, de soltar risos em alguém, de emocionar alguém. uma brincadeira no trabalho, um telefonema na parvoíce, o permanente divertir, provocar, sentir quem nos rodeia. quase defeito, esta procura permanente de perceber o outro em frente, de o animar, de o confortar. ou simplesmente de cuidar. são especialmente bonitas as pessoas que se perdem a cuidar dos outros, dos que nos pertencem, sejam família, amigos, sobrinhos, ou apenas próximos. porque são esses momentos que nos dão sentido à vida: adormecemos com a sensação terna que fizemos o nosso melhor por alguém, que fomos o melhor de alguém.

mas único, são as pessoas que nos fazem completos.
sim, porque podemos ser felizes, ter o coração cheio, podemos ser independentes de todos, mas no fim do dia, há uma coisa que nunca seremos sozinhos: completos. podem vir mil filósofos das teorias modernas da independência, mas quem já amou de verdade, entende bem o que digo. porque quando se conhece a outra metade de nós, percebemos que fomos feitos assim: apenas metade. na espera do outro encaixe, da peça do puzzle que fica ali, exactamente no abraço perfeito, no corpo que se sente colado, no beijo que é energia, na pele que se toca e dá choque.

não é alguém igual a nós, isso é a nossa cópia. não, mais que isso, é alguém que sendo diferente, tem os pontos de encaixe perfeitos em nós. que tanta vez dão faísca, que arranham com as dificuldades da vida, que magoam com as merdas que fazemos torto, que quase partem com os timings errados. mas é a única peça em que sentimos o alívio estranho de que não há mais nada para ver, para procurar. aquela em que para estar em sossego, apenas precisamos do nosso canto, os dois, sozinhos. em que a conversa nunca acaba, o riso é sempre parvo e bonito, o amor é sempre lamechas e exagerado, em que o desejo é sempre louco e permanente, só superado pelo sossego do sono junto. são esses momentos, tão simples - basta eu e tu - que me dão sentido ao corpo: em que adormeço com a certeza rara que é ali, parte de ti, que sou maior. 



6 comments

  1. Sofia17.9.15

    Que bonito!

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  2. Perfeito ! Tão bonito !

    Beijinho

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  3. E é tudo assim, como está descrito, e tão bem escrito.

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  4. Maravilhosamente doce e lúcido.
    E é tão rara essa mistura.

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  5. Adoro as suas palavras e as músicas que escolhe. Não páro de ouvir!
    Obrigada pelas palavras.

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  6. Anónimo20.11.15

    Mais um texto fantástico. Aguardamos ansiosamente por mais. Sentimos a falta após tanto tempo de ausencia. Penso que falo em nome de todos os seguidores deste blog.

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