:: a espera(nça)

setembro 09, 2014



se há coisa muito latina, ainda mais que a saudade, é a esperança.
e quer uma, quer a outra, são atestados de fatalidade. porque fica-se na saudade, quase como alívio de não se ter. porque fica-se na esperança, quase como lamento de não se ter conseguido. "era bom, mas que fazer: resta esperar". e como sedativo da alma, canta-se o fado, bebe-se um copo, que quem espera sempre alcança (mentira). afogam-se as mágoas num ombro amigo e espera-se. espera-se que o mundo se vire para nós, espera-se que o trabalho fique melhor, espera-se que o outro apareça naquela esquina. ou então não. não se espera: faz-se. se o mundo não roda, rodamos nós no mundo, se o trabalho não melhora, fazemo-lo nós ficar diferente. se o outro não aparece, viramos nós a esquina.

é que fazer, significa que se acredita. que é bem diferente de - apenas - ter esperança.
a esperança é um ilusão. acreditar é uma decisão. ter esperança é ficar parado a contar que o mundo mude pela acção de alguém. já acreditar é fazer o mundo andar - é fazer todos os dias alguma coisa, mesmo que infimamente pequena, para que o mundo ande, para dê um passo em frente, ou pelos menos, para que levante o pé. na esperança ficamos sempre nas mãos dos outros: quase conforto da inércia, alguém - ou o destino -, hão-de fazer por nós. pelo contrário, quando acreditamos de verdade, tomamos as decisões nas nossas mãos - ninguém fará melhor do que nós. porque todos podem dizer que não é possível, que não vai ser verdade, que não existe. mas quando se quer de verdade, não se espera para ser: faz-se. não se aguarda: luta-se. porque eu não espero que alguém consiga: eu sei que eu vou conseguir.

é por isso que eu já não tenho esperança. matei-a.
deixei-a afogar-se nas lágrimas tontas da tua ausência, no aperto das saudades que julgava ter, mas que eram mentira. tenho falta, tenho vontade de ti, mas nunca saudades. porque só se tem saudades do que se esqueceu, e tu, estiveste sempre aqui, estás aqui, todos os segundos. eu não tenho mais esperança na nossa história: isso era ficar parado. não, o destino já nos juntou de uma forma tão improvável, que agora está tudo nas nossas mãos - sem esperanças, mas com muitas certezas. porque quando se acredita é-se fiel. não a alguém, não a uma fé, não a um destino. é-se fiel ao que se quer. e essa é a maior alegria do mundo: saber o que se quer. sem esperanças falsas na ilusão do que vai ser, mas com todas as certezas do que se faz, todos os dias, para ser. e é essa a alegria que me dá força: é eu saber que te quero. é eu saber que nos queres. cada dia mais..

4 comments

  1. caramba, caramba...adoro ler-te!

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  2. Anónimo13.10.14

    A força de vontade que eu sinto com as suas palavras é incrível.
    Descobri o seu blog por mero acaso e sinceramente estou fascinada.
    Ideal de vida definido, ideias objectivas e firmes. Focus, concentração e empenho.
    Tenho a certeza que o conheço! Porquê? Não sei.. Não tenho a menor ideia, mas realmente acabou de entrar na minha casa e terei todo o gosto em "acompanhar" os seus pensamentos.

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